
Neste mês de junho (dia 04/06) a Lei da Ficha Limpa completou dois anos e também foi validada pelo STF possibilitando assim a aplicação da lei nas eleições municipais de 2012. Para comemorar essa vitória popular, O Anunciador relembra a entrevista, exclusiva, com o magistrado Márlon Reis, um dos fundadores do MCCE – Movimento Contra a Corrupção Eleitoral – e juiz da cidade de Imperatriz, no Maranhão.
Confira:
O Anunciador: como surgiu a ideia da Lei Ficha Limpa?
Márlon Reis: A ideia de realizar essa campanha tem muitos antecedentes. Mas identifico como o principal, a luta de católicos do Rio de Janeiro pela restrição de candidaturas de pessoas envolvidas com o crime organizado naquele Estado.
D. Dimas Lara, então Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro, estava à frente dessa iniciativa, que conseguiu convencer inicialmente o Tribunal Regional Eleitoral do Rio e, posteriormente, outros TREs, até que o Tribunal Superior Eleitoral viesse finalmente a derrubar a tese de que nem mesmo seria necessária a existência de lei para barrar tais candidaturas.
Foi o mesmo D. Dimas quem trouxe para o MCCE a ideia de realizarmos essa campanha pela conquista da Lei da Ficha Limpa.
O Anunciador: como magistrado, de que modo o Senhor viu sua participação dentro desse projeto popular?
Márlon Reis: Sinto-me honrado por haver tomado parte nessa bela história. Muitas vezes vi como a legislação eleitoral é inificiente. Agora há critérios mais rigorosos para a definição das candidaturas.
O Anunciador: como cidadão e não magistrado, de que maneira o Senhor vê a Lei da Ficha Limpa?
Márlon Reis: Vejo antes de tudo como um formidável exemplo de mobilização. A sociedade brasileira demonstrou que é capaz de sensibilizar o Parlamento por meio da pressão cívica. Foi uma conquista histórica que nos demonstra que não vale a pena ficar reclamando. Precisamos nos organizar coletivamente e lutar pela conquista dos nossos objetivos como sociedade.
O Anunciador: na sua visão, qual o papel dos magistrados na execução dessa lei e como eles podem contribuir para o combate a corrupção no Brasil?
Márlon Reis: A magistratura brasileira tem um papel fundamental no aprimoramento da nossa democracia e no combate à corrupção. Para isso, é preciso que seja concedida prioridade aos processos que tratam da lisura nos processos eleitorais e de casos de improbidade administrativa. Se pudermos agilizar a tramitação desses processos, teremos cumprido o nosso papel.
O Anunciador: quando no ano passado a lei foi aprovada qual foi o sentimento que lhe aplacou? E qual foi, novamente, o sentimento diante a decisão do STF em não aplicar a lei nas eleições de 2010?
Márlon Reis: Ficamos muito felizes com a aprovação da Lei da Ficha Limpa e com sua sanção pelo Presidente da República, o que ocorreu sem vetos. Gostaríamos que a lei houvesse sido aplicada já em 2010. Entretanto, acompanhamos com serenidade a decisão do STF de adiar a sua aplicabilidade para o ano que vem. Essa lei não foi pensada para atingir ninguém em particular, mas para impactar o resto da história democrática do Brasil. Então, que venha 2012.
O Anunciador: hoje, com um ano da Lei Ficha Limpa, é possível que algum candidato consiga burlar a lei nas próximas eleições, em 2012?
Márlon Reis: Certamente surgirão novos desafios. Já há projetos de lei tentando mitigar, enfraquecer os efeitos da Lei da Ficha Limpa. Isso acontece porque o número de pessoas que serão atingidas no ano que vem será muito maior do que as afetadas em 2010. Há muitos políticos poderosos em âmbito local que ficarão de fora dos pleitos em 2012.
O Anunciador: é possível fazer um balanço de um ano da Lei Ficha Limpa? Qual seria esse balanço?
Márlon Reis: A Lei da Ficha Limpa impactou positivamente as eleições em 2010. Ela trouxe à baila a reflexão sobre o passado dos candidatos. Muitos perderam a eleição por causa dos novos paradigmas introduzidos pela iniciativa popular. Mas o mais importante é que temos uma lei eficiente, democrática e em pleno vigor para as eleições que se aproximam.
O Anunciador: pensando no futuro, qual a sua expectativa para a Lei Ficha Limpa? Pode-se modificá-la, ou ela já está completa diante da grande inovação em formas de corrupção de nossos políticos?
Márlon Reis: A democracia é um processo. Sempre será possível aprimorar a Lei da Ficha Limpa. Mas no momento nosso principal desafio é assegurar a sua efetividade. Depois pensaremos nos novos desafios.
O Anunciador: agora que a Lei Ficha Limpa já está valendo, qual será o novo projeto do MCCE? A reforma política?
Márlon Reis: Estamos neste momento tratando de formular um projeto de reforma política para discutir com a sociedade brasileira. Essa deve ser uma preocupação de todos, não algo deixado ao exclusivo critério dos atuais mandatários, já que estes têm interesses pessoais em jogo.
O Anunciador: para encerrar, qual a mensagem o Senhor deixa aos cidadãos descrentes de mudanças na sociedade política e do modo de fazê-la no Brasil?
Márlon Reis: A Lei da Ficha Limpa é um exemplo de mobilização. Podemos utilizar esse modelo para construir muito mais. A atuação em rede e a mobilização ampla da sociedade – em reuniões presenciais, palestras ou na internet – são ingredientes indispensáveis para qualquer conquista.
por Marquione Ban
imagem Marlon Reis